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Ortorexia: quando ser saudável é uma obsessão

 

        Preocupar-se de forma exagerada com os alimentos e sua preparação podem ser alguns dos sintomas da doença, que tem consequências devastadoras para a saúde física e mental

 

 

       

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Por Nicole Fusco, Giulia Gramuglia e Mariana Agati

         

        Banir o açúcar, eliminar as gorduras trans, passar horas a fio analisando a embalagem dos alimentos e não consumir refeições preparadas por outras pessoas. Esses são alguns dos sintomas da ortorexia, um distúrbio alimentar que torna a busca por ser saudável em obsessão. Embora ainda não seja reconhecida pelo manual da psiquiatria, a doença vem atingindo cada vez mais pessoas, que fazem do ato de alimentar-se uma verdadeira missão. No Brasil, não há estatísticas oficias, mas, de acordo com dados do Centro Nacional para Distúrbios Alimentares da Inglaterra (NCFED, na sigla inglesa), mais 6.000 ortoréxicos pedem ajuda por ano, conforme mostrou reportagem da BBC Brasil sobre o tema. “Nos meus trinta anos de experiência, calculo que uma em cada dez mulheres e um em cada vinte homens sofra de ortorexia”, disse a especialista do NCFED Deanne Jade à publicação.

 

       Algumas pessoas estão mais sujeitas a serem vítimas da ortorexia do que outras. Segundo a terapeuta Vania Calazans, é mais provável que o distúrbio se desenvolva naqueles que se preocupam demais com a saúde e a aparência física, e também em quem já engordou ou emagreceu excessivamente. Isso porque a ortorexia está diretamente relacionada com a busca pelo corpo perfeito e, para um ortoréxico, o físico ideal precisa ser conquistado a qualquer custo. O problema é que, mesmo com exercícios e alimentação controlados, nem sempre a genética permite atingir os tão desejados padrões, causando assim uma frustração. A nutricionista Renata Dias, que trabalha nas áreas de nutrição clínica, reeducação alimentar e emagrecimento, afirma que “os parâmetros divulgados pela mídia e as referências utilizadas podem induzir as pessoas a buscarem um corpo perfeito que não se adequa ao seu biotipo corporal genético. Ainda assim, a ideia de uma pessoa ortoréxica é conquistar o corpo ideal e perfeito de qualquer maneira”, diz ela. Dias, que faz o acompanhamento de pessoas com esse distúrbio alimentar, diz ainda que jovens que frequentam academias também estão mais vulneráveis à ortorexia.

 

       As consequências da ortorexia são devastadoras. Biologicamente, o ortoréxico pode apresentar deficiência de algum nutriente essencial ao bom funcionamento do organismo, uma vez que alguns alimentos são retirados da dieta por serem considerados impuros, ou seja, por conterem corantes, conservantes e agrotóxicos, por exemplo. Quem tem o distúrbio pode, portanto, ter anemia, ostopenia, déficit de vitaminas e micronutrientes, fome oculta, além de queda de cabelo, unhas quebradiças, entre outros. Há a tendência também que a doença atrapalhe o rendimento nos estudos e no trabalho. Isso por que a fixação pela dieta saudável pode consumir todo o tempo e energia do doente, assim como se estender para a sua vida social. Isso porque, para manter a dieta e não “cair na tentação”, muitas pessoas deixam de participar de encontros com os amigos e almoços em família. E é justamente a família que, na maioria dos casos, percebe os exageros e corre atrás de intervenção médica. “Normalmente, os ortoréxicos não procuram tratamento porque não sentem que sua conduta alimentar restritiva lhe traz prejuízos”, afirma Vania Calazans.

 

       Entre os sintomas dos ortoréxicos estão a preocupação excessiva com o conteúdo nutricional dos alimentos, a dificuldade em comer uma refeição preparada por outra pessoa e a análise e comentários feitos sobre como as outras pessoas preparam a comida. Mas a terapeuta Calazans adverte: existem diferenças entre seguir uma alimentação saudável e ser ortoréxico, evidenciada pela qualidade de vida. “Os ortoréxicos privam-se dos prazeres da alimentação e chegam a se isolar socialmente para não sair das suas regras alimentares”, diz ela. É preciso levar em consideração também que muitas pessoas são intolerantes a glúten e a lactose, o que deve ser diferenciado do distúrbio alimentar. A nutricionista informa que é preciso fazer um exame de sangue no paciente, para poder identificar se há ou não um quadro de intolerância aos alimentos que possuem essas proteínas. Somente depois disso é feita a análise dos sintomas do transtorno ortoréxico.   

 

        Além disso, há o risco de o ortoréxico desenvolver outros transtornos alimentares mais graves, como bulimia e anorexia, segundo Dias. “São diversas as consequências que o transtorno ortoréxico pode causar ao nosso organismo, como, por exemplo, diabetes, hipertensão, problemas cardíacos, osteoporose, insuficiência renal entre outros.” E como é feito o tratamento? Vania explica que são realizados exames físicos e de sangue para avaliar a condição geral do paciente, anamnese detalhada e acompanhamento psicológico, considerando o histórico familiar. “O ideal é que o paciente seja acompanhado por uma equipe multidisciplinar, envolvendo médicos, nutricionistas, psicoterapeutas, entre outros profissionais da saúde.”

 

      Para ter uma alimentação saudável e evitar distúrbios como o ortorexia, a nutricionista Renata Dias afirma que a solução é apostar no bom e velho “prato colorido.” É aquele prato que contém todos os grupos alimentares, como carboidratos, proteínas, lipídios, vitaminas, minerais e fibras. “Assim, com todos os nutrientes, o organismo funcionará regularmente e sem exageros”, completa. Para a terapeuta Vania Calazans, “ser saudável é saber escolher alimentos que não prejudicam a saúde sem fazer com que isso traga situações de privações constantes e rígidas, que podem vir a afetar a vida psico-social do indivíduo”.

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